Aqui,
agora, caminhando sobre meus próprios passos durante pouco mais de meio século
nesta via crucis (caminho da cruz) por que passa a humanidade exclamo aos
quatro ventos “eu vi a implosão da dignidade humana” e abro as cortinas para
que a percebam.
Perto
dos dez anos atento a voz do radio, requisitado em nome da legalidade, me
marcou aquela imagem, barba por fazer, a metralhadora pendurada nos ombros, o
Brizola em seu discurso inflamado a conclamar o povo na resistência pela
legalidade em frente ao palácio do governo estadual, foi meu primeiro
aprendizado sobre golpes planejados contra a dignidade humana, graças a este
esforço nesta ocasião conseguimos evitar.
Enquanto
convivia com uma afirmação de políticas publicas destinada a corrigir as
grandes distorções existentes na sociedade brasileira, na minha memória a luta
pelas reformas de base ficou marcada como grande tema do governo em sua
conversa com a população em busca da preservação de sua dignidade, em paralelo
percebia o pacto entre a elite brasileira e os mecanismos de intervenção do
império representando os interesses internacionais dirigidos a sabotá-la.
Não se
passaram dois anos acompanhei aquela procissão programada com esperteza sempre que
se torna necessário, o arrastar-se pelas ruas, como serpente venenosa, dos
defensores da tradição, da família e da propriedade, sempre petulantes falando
em nome de Deus sob a benção da imprensa comprometida com a elite econômica, cumprindo
seu papel de precursor dos tanques nas ruas para esmagar a digna liberdade com
sua mais pura ditadura.
Quatro
anos onde cada vez mais eu vi o mostrar à cara do golpe militar, de A5 na mão a
usar o direito que só a violência armada lhe concedia contra a população, enquanto
do nosso lado fazíamos os cavalos dançarem sobre bolinhas de gude nas manifestações
sempre que tentavam nos dispersar, do lado deles mais hábeis por seu uso
indevido de força bruta, liquidavam a população nos porões da ditadura, torturando,
semeando morte de nossos amigos pelo simples fato destes com eles não concordar
e seu regime de força não aceitar.
A
ilegalidade do regime prosperou com os métodos que mais conhecemos grandes
investimentos em obras destinadas a propagandear o regime e grandes desvios de
dinheiro a sustentar sua manutenção e comprar parte da população, os inocentes
úteis de sempre, bipartidarismo hipócrita destinado a criar um simulacro de
democracia, quanto a nós continuávamos há percorrer o tempo, oprimidos em nosso
pensar, com as manifestações culturais censuradas e os conteúdos pedagógicos
alterados por reformas destinadas a aparelhar as mentes contra o pensar.
Ninguém
consegue a alma libertária calar e conseguimos a muito custo espremer a
violência para o canto das cordas no ringue, obrigando-a via transição política
a nós a democracia devolver, mas a elite em nenhum tempo abriu mão de conspirar
contra o povo, uma anistia de mentirinha com salvaguarda para torturadores, mas
este povo buscava para a nação uma solução que harmonizasse as pessoas através
de uma justa distribuição de renda contrariando privilégios históricos a bradar
pelos quatro cantos a dileta frase “eleição direta já”.
Não que
a vitória tenha sido alcançada apenas avançamos e neste avançar passamos por
percalços tipo Sarney, modelo Collor de modernidade e uma estranha aproximação
da direita do sociólogo antigo exilado Fernando Henrique, mas ainda nos tinham
reservado noticia pior, como depois o vimos, a imposição de um golpe de estado
de gabinete e a construção de novos modelos baseados na manipulação tecnológica
de dados dos comportamentos pessoais para manter a elite no poder, era o tempo
de trabalhar a globalização na rede.
Pude
ver que nunca perderam a receita, nunca deixaram de ter o império a lhes
financiar, se então desta feita não cabia mais os tanques na rua botar, novos
tempos, novas maneiras de o golpe prosperar não seria difícil encontrar, por
aqui no meu canto acompanhando todos estes ardis do sistema agora conectado e
globalizado ficou cada vez mais difícil encontrar maneira de quebrar o encanto
deste falso canto das sereias com notas fascistas no ouvido do povo ecoar.
Mais um
momento me cabe viver na história agora com a construção de uma circunstância
muito favorável ao crescimento do fascismo, explorando o lado conservador da
população brasileira em especial de sua classe média que sonha enquanto
trabalha para a elite parte da mesma vir a ser.
Receita
fácil de sucesso, um punhado de frases grotescas, propagar a ideia de pulso
forte, defender a família patriarcal com sua propriedade, brincar de hipocrisia
moralista apontando o dedo acusador de imoralidade para gêneros diferentes,
atacar educação libertária e a diversidade cultural, encontrar um alvo inimigo
para uma guerra santa, falar sempre em nome de Deus, autodenominar-se salvador
da pátria.
Para
tal receita funcionar temos pequenas condições a serem cumpridas, é preciso
antes preparar o cenário como dantes já tínhamos visto, temos que contar com os
que se vendem como sempre por 30 moedas o que convenhamos num Brasil no estagio
que nos encontramos hoje não é muito difícil, há candidatos por todos os lados.
Não esquecer nunca dos
patrocinadores, claro que temos os de sempre o império e seus parceiros do
mundo dos negócios locais e internacionais, uma mídia comprometida com
interesses de quem a sustenta, acrescido dos inocentes úteis para bem servir a
causa.
E o
respeito à dignidade humana, que se imploda, é o que pregam, pois para os
mesmos dignidade é servilismo, é entrar nos eixos, o famoso manda quem pode
obedece quem precisa, em sua matemática simples sabem que aumentando os mais
precisados multiplicamos as vantagens dos exploradores.
O
primeiro ataque sempre é contra a educação, reforma sobre reforma para evitar
qualquer indicio de escola libertária o primeiro combate é contra o espírito
critico, sabota-se via o ensinar utilitário, de preferência em uma escola
autoritária insistente em trabalhar o decorar contra o pensar.
O
segundo movimento passa sempre pela exploração do medo a morte, aí nada melhor
do que fechar uma parceria com as religiões, onde trabalhar este temor permite
que se faça qualquer coisa em nome dos deuses, e como temos leitores da vontade
divina, muito estranho como são seletivos estes deuses na escolha de seus
ministros, acho que é esta nossa vocação para sempre precisar de
representantes.
No
terceiro tempo é disfarçar o autoritarismo camuflando-o como um movimento de
salvação nacional, o que em tempos de rede soberana com suas noticias falsas
aliadas à desinformação de uma comunidade afastada do ato de pensar é muito
fácil via algoritmos opressores poderosos manipuladores dos grandes bancos de
informação.
Então
como puderam ver circulei por pouco mais de meio século nesta sequencia de
atentados a dignidade humana e sua consequente implosão, estão criando um ser
humano desprovido de sensibilidade na direção ao outro, concentrado cada vez
mais nas dificuldades que encontra na solução tão somente de suas necessidades
particulares.