Amanheceu na
praia à beira do mar com aquela sequência de esculturas criadas pela suave
pressão de pés sobre a areia a demarcar passos, ao vê-los concluí que foram realizados
por alguma misteriosa entidade focada em convidar-me a decifrar suas incógnitas
certezas através de fantasiosas chamadas a minha imaginação, se me pedes
garantias da minha descoberta só as posso dar na direção de sua mais completa
virtualidade não podendo nem lhe afirmar que não teriam sido minhas próprias marcas
de outros tempos de outros espaços.
Impossível me é
evitar a associação a seres em mim descritos como reais e por certo assim o são
se ninguém os criou eu com certeza os esculpi em meus pensamentos, lhes dei a
cor dos olhos o tamanho dos cabelos a pureza dos lábios e principalmente a
esperança de caminhar ao seu lado, em algum mágico momento me fazia de seu
complemento em resposta a um acalentado desejo que tão somente eu sei ser o seu,
sim não só criei como lhes dei finalidade associando esta por certo a mim mesmo
e às minhas necessidades.
Por favor, não me
cobre o detalhamento da personagem não posso precisar mais o gênero a raça nem
mesmo seu tamanho ou sua graça, durante minha caminhada em companhia desses
passos marcados no chão tal qual um camaleão ela correspondeu a desejos
concorrentes em mim existentes, todos lindos e capazes independente de sua
especificidade a atender minhas multifacetadas carências sendo sempre o outro
do momento.
Certamente
rastros que deixei também já foram pedaços de infernos ou céus em outros também
estes me enxergaram de tantos jeitos e maneiras que a infinidade dos números
não me permite contar e por mais que busque não encontro nunca espelho que
assim me reflita permitindo que eu me contemple transmutado na imagem que foi pensada
de mim por outrem, assim sendo sou condenado a eternamente ficar com a figura
que tenho de mim mesmo.
Todos esses
fantasmas criados à imagem e semelhança do ser humano são pensamentos irmãos independem
para tal de classificarem-se como amigos ou de catalogarem-se como inimigos, inclusive
não importa de onde advêm são sempre desiguais, visões originárias do mesmo ou
de distintos seres têm em sua unicidade o diferencial que nos iguala, nossa
individualidade no espaço e no tempo é o DNA a comprovar nossa origem única.
Se as delicadas
marcas de pés na areia como licença poética impõem-se com mais força que o
ruído de tantas outras pistas com as quais nos defrontamos no dia a dia, marcas
que iniciam nos nossos sonhos e prolongam-se até o estertor do dia, estas que
podemos chamar de chulas presenças são guias tão propícias como as classificadas
de ricas rimas para alimentar nossa fome de vida, só é possível saciá-la com
este recurso nutricional que produzimos ao lermos e interpretarmos os
obstáculos que se interpõe entre nós e a natureza no tempo.