Encontro-me de
tempos em tempos frente a uma situação que abomino é a de expressar-me com
palavras que a outrem ferem causando dor e não por acaso a intensidade destes
momentos ocorre na proporção inversa do tamanho do amor que sinto pelo meu
interlocutor.
Nem sempre consigo
evitar, apesar de saber que todo o dia deveria fazê-lo, o estrago de uma frase
inadequada tendo como destino quem muito amo, o gostar nos dá certas liberdades
indevidas, por certo, onde o dito em nada corresponde ao sentido n’alma e assim
sendo magoo quem nunca quis nem de leve desagradar.
Acredito
sim no direito irrestrito de quem a ouve tomá-la no sentido mais desagradável
aplicando-se a indignação de considerá-la ofensa pessoal processar este
desencanto como quebra de laços com necessária busca de reparação.
Como curar a ferida
infringida se não há borracha que apague a frase feita, o que foi sentido naquela
oportunidade incorpora-se no imaginário da relação existente, sempre são frases
mentirosas destinadas apenas ao argumento do momento, nascem mortas para mim
que as proferi por imediato arrependimento de tê-las dito, no contraponto são eternas
á quem as ouve, pois maculam seu bem querer por mim.
Se pudéssemos sempre
resolver tal impasse simplesmente com afeto e carinho seria tão lindo, lamentavelmente
faltam pontes estas as sentenças destruíram, nos restam novas palavras novas
possibilidades de desencontro na busca do bom caminho até cicatrizarmos a
ferida aí sim com o instrumento da paixão que é o roçar dos espíritos e corpos
que se amam.
Não gostaria de condenar-me
a filtrar a intensidade de uma relação pela razão, adoraria ter um apagador que
colocasse tudo no seu devido lugar que de fato é vontade enorme de partilhar
vida e nunca inúteis palavras, gostaria que como telepatia pudesse passar o
sentimento real existente que em nada corresponde ao mal entendido.
Desviamo-nos demais da
pureza do encontro no outro, precisamos de tantos artifícios para passar nossos
sentimentos que corremos o constante risco da palavra que machuca quando apenas
gostaríamos de estarmos juntos no silêncio das almas que se amam, a palavra que
machuca quase sempre foi dita sem nenhuma intenção de fazê-lo.
Esprememos,
esfregamos, aumentamos sua profundidade, alargamos seu tamanho, a ferida agora
é já maior em nós do que no outro, nos sentimos incapazes de corrigir o dano, nunca
depende de nós derrotados as condições da rendição e como tal temos que ter o
cuidado calmo de transferirmos a dor para nós, sabedores que mesmo cicatrizando
sua ferida com o aumento da nossa chaga, sempre estaremos expostos à marca que deixamos
e quanto mais privilegiados em preparo para vida formos os dois, mais complexas
são as negociações para restabelecer o ponto de equilíbrio ditado pela paixão.