sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Asfixiados por Botas Sujas – miniconto.


                Era uma terra estranha, cuja vocação exercia-se no contraste, o que tinha de bela tinha de desumana, quem se dispunha a servir parasitava o povo, quem exigia a liberdade a queria para escravizar, confundia seus direitos com o poder de discriminar, onde a religião tinha seus deuses a serviço da violência, sua enorme riqueza era feita para poucos acumular, enfim uma pátria que condecora como mérito os desmandos do outro a explorar.
                Escutava-se o ritmado ruído surdo das botas sujas a asfixiar a cultura, negando-lhe crédito, sonegando-lhe valia é julgada por perdulária por desnecessária, a reflexão manifesta em arte por sua característica libertária é condenada.
                Seus mares com suas bonitas praias de águas azuis esverdeadas testemunhavam no dia a dia a miséria a espalhar-se, sua oligarquia gananciosa roubava a qualidade do ensinar para assim melhor ao povo aparelhar, seus juízes serviam os senhores para a injustiça perpetuar, o trabalho era destinado a locupletar os senhores de outras terras via assalariados feitores, traidores escolhidos no próprio local, para qualquer contestação violenta repressão vinha se manifestar.
                Escutava-se o ritmado ruído surdo das botas sujas a asfixiar a educação, negando-lhe o direito do ensinar o pensar, sabotando estudos de filosofia, sociologia e história em nome do pratico capacitar nas habilidades necessárias ao mercado de mão de obra para melhor servi-lo.
                Seu povo multifacetado com sua linda pura mescla de raças e culturas ao qual espalhavam boatos de nefastos inimigos que a qualquer momento viriam à liberdade de todos roubarem, como se esta dita liberdade não fosse uma farsa por sua sujeição a maquina de exploração e consumo, sob o tacão desta inverdade oprimiam a população com o falso refrão de assim protegê-la contra maldosos os defensores da tradição, família e propriedade.
                Escutava-se o ritmado ruído surdo das botas sujas a asfixiar o direito a justa distribuição dos benefícios da produção de toda nação, conceituando o tal de “mérito” pela capacidade de o sangue e o suor de outro acumular e abençoando quaisquer métodos como dignos de justificá-lo.
                Estive lá e assim a vi mais do que vê-la pude perceber que nada disto era novo que gerações mais gerações trabalharam com afinco para construir e mantê-la assim contraditória, destruindo as vontades libertárias, semeando o medo a falsos fantasmas e principalmente comprando via migalhas os feitores da escravidão prometendo-lhes parte do pão sonegado a multidão.
                Voltando a casa, porque o bom filho sempre a casa torna, ao discutir com amigos as impressões daquele lugar e as marcas que ele a mim está a deixar, lembrei-me de pequenas impressões que o convívio com as pessoas de lá me trouxeram e das quais não gostaria que estivéssemos a nos contaminar.
                Um me dizia que o joio do trigo nós temos que separar, que lhe parecia justo ao primeiro exterminar para o segundo prosperar, mesmo que queimasse no fogo algum aparente inocente por certo isto aconteceria porque alguma culpa este teria, julgava-se no direito de identificar quem era trigo e quem era joio simplesmente por ao outro se comparar, tinha sempre certeza de ser o certo logo o outro só poderia estar a errar, mas isto é do homem até posso aceitar, mas como pode a outro esta tarefa delegar dando-lhe procuração para em seu nome justiçar.
                Outro falava da propriedade sagrada a preservar, valendo qualquer violência que se pudesse imaginar, armado até os dentes para aproximações indesejadas afastar, este seu direito divino a vida do outro deveria preservar para suas posses não minar, talvez em sua memória estivesse alguma história, em outros tempos, ter sobre terreno do vizinho à sua cerca posto a caminhar e da defesa intransigente que fizera a esta posse indecente. 
                Um terceiro se punha como abençoado para o comportamento de cada um determinar, afinal ele tinha entendido em especial confidência do divino por certo, o papel que cada qual aqui deveria executar, em nome dos seus deuses, para se santificar, conhecia dos gêneros o comportamento a esperar e aos impuros o direito tinha de segregar e exterminar, cada um deveria reconhecer o seu lugar e assim o aceitar.
                Muitos me propagavam a diferença de posição social ao qual a genética os destinava, é tão obvio que uns nasceram para mandar e outros em seus cromossomas tinham a gene do obedecer, ao qual deveriam se resignar, pois este foi o direito que lhe deram ao nascerem os construtores do universo dos quais eles se julgavam os únicos bens amados e este poder herdar.
                Para nós não foi dificil antever o que pudemos constatar quando em comitiva, as mochilas nas costas, nos deslocamos em viajem para rever o povo e o lugar.
                Outdoors a conclamar “Ame-o ou deixe-o” misturavam-se aos espaços urbanos conclamando o povo a aprovação incondicional dos mandos e desmandos, tudo envolvido no acontecer de um ufanismo oficial enlouquecido.
                Atenção sempre em alerta, cuidado com a porta aberta, policiando seu dizer para evitar má interpretação e ficar a descoberta, circulava a multidão dispersa com medo do como a vão ver, evitava em grupos aparecer para contra a ordem não sugerir ser.
                Nas redes e mídias circulavam todas iguais às noticias, diferentes do boca a boca que corria em forma de quase sigilo, tinham a cara de um mesmo livro, sempre por um mesmo autor escrito.
                Espalhafatos eram os aparatos de grupelhos de justiceiros, enfeitados com seus símbolos vivos e barulhentos corriam atrás de suas inventadas bruxas para queimar, ofensas a moral e aos bons costumes por eles criados, não podiam aceitar, por isso estavam a usar seus mecanismos de combater e segregar.
                As frases eram curtas, incisivas, falsamente positivas, gritos de guerra prontos, acabados, como verdade por si só, sempre desnecessário sobre elas o refletir e o pensar, pois mostravam o poder e como tal sempre estão a acertar.
                Veículos militares por todos os cantos a circular a ordem impõe-se pelo medo que a violência ostensiva pode gerar além de pequenas milícias a paisana buscando assim a todos intimidar.
                Tudo era unanime, proibido era discordar, definitivamente você era bom por ser a favor, ou mau por contrariar, nesta dualidade tipo céu inferno você tinha que se adaptar.
                Encerrando nosso passeio por esta estranha terra, com estas sensações impregnadas na pele, ainda ao aqui chegar escutávamos n’alma o ritmado ruído surdo das botas sujas a asfixiar...   

terça-feira, 25 de setembro de 2018

Rejeito Ser um Discurso - miniconto.

                Repasso esta confidência para vocês do mesmo modo que por mim foi recebida, decidir se a aceitam como história ou estória, eu deixo a critério de cada um de vocês, até porque não tem como ser diferente, a verdade esta sempre associada a cada um de nós, o que não poderia permitir-me não fazer é deixar de repassar-lhes a mesma pelo encanto que ela me sugeriu.

Sabes quando depois de uma boa hora de caminhada entre as frondosas arvores do parque liberas para teu prazer àqueles minutos do estirar-se no banco, dedicando-se a contemplação da natureza, da qual fizemos parte, ou, a bisbilhotar as letras enfileiradas em palavras e frases que aprisionadas estão em mais um livro, do qual somos cúmplices pelo simples fato de manuseá-lo.

Naquele dia ensolarado estava de braços com o livro, coisa leve linda contos de Tchekhov, um contador de estórias que muito aprecio, quando me perguntaram: “Que horas são”? Logo percebi que estava em minha frente à intenção de abrir uma conversa tão somente, pois seguiram a sua pergunta outras frases enfileiradas com rapidez, observações sobre a beleza do tempo entre outras exclamações, àquelas que são feitas apenas para manter vivo o fogo da conversa.

Tendo aberto uma pequena fresta na barragem, de imediato inundou-me sua história, serpenteando para lá, para cá, com seus altos e seus baixos pelas linhas que seguem como podem bem o ver.

Era praça publica pequena multidão do tamanho suficiente para ser grande e onde todos podem se ouvir e se falar, o centro do grupo era ocupado por um belo discurso, o orador o valorizava por seu talento na dicção e ritmo do som das frases, o tema era relevante dizia respeito a toda aquela gente e a lógica do pensamento tinha a benção da direção ao bem comum.

Pode-se talvez até dizer, pelo fato de não originário da terra, invisível era o seu circular no meio daquele povo, mesmo não sendo visto ele longe estava de ser desinteressado, antes pelo contrario, estava muito atento em perceber a sintonia entre o discurso e os seus ouvintes, era o seu estilo de bisbilhotar, aquele curioso especial que se preocupa com os outros seres humanos, em síntese um observador da alma humana.

Abrindo parênteses já perceberam que o espaço e tempo em nada preocupa nosso amigo, tentei inquiri-lo sobre tal, o mesmo desconversou dizendo que não interessava e que até não acreditava nisso para ele homem e natureza sempre foram os mesmos, uma definitiva opção pela vida nada mais do que isso, o que para um banco de praça me pareceu ótimo.

Como sempre neste tipo de evento percebeu que o grupo se dividia alguns claramente elogiando as bondades do tema, outros mais na defensiva questionando as consequências possíveis de sua aceitação, havia sim um consenso de que o mesmo deveria ser tratado e era oportuno o que justificava a adesão de todos há aquele momento.

Em sua reflexão percebeu que estava ali se realizando uma vocação do ser humano a defesa das ideias e que estas podem ser qualificadas positiva ou negativamente e que por certo deste se originariam muitos outros discursos de negação ou de apoio e mesmo até de sugestão para outros rumos esta é uma dinâmica que podemos admitir movimenta os nossos dias e por sinal sempre assim o foi, o discurso pode e deve ser julgado.

Também ao circular percebeu que as propostas apresentadas não eram de fato um traje sobmedida para nenhum dos participantes, isto era patente nas objeções e até nos apoios sempre construídos com um “mas...” o que por sinal lhe trouxe a alegria de que sim o Homem é um ser livre e único capaz de relacionar-se com os outros sem perder sua identidade.  
 
Mas o que realmente o deixou motivado foi verificar que estavam lado a lado pessoas com posições as mais contraditórias, não se aproximavam entre si as de interpretação semelhantes e sim conviviam todas no respeito à identidade do outro, não havia o julgamento de pessoas e sim o respeito ao momento vivido por cada um, que por certo representavam experiências diferentes a serem consideradas como coerentes para as suas vidas, em nenhum momento indicava-se um caminho de abrir mão do pensar, mas sempre uma ponte a compor diversidades, havia no ar a compreensão de que os momentos pessoais são diferentes e que o de cada um representa o seu viver.

Naquela pausa para respirar lembrei-me do que estamos hoje involuntariamente partilhando um gigante investimento em tecnologia para enquadrar o homem na armadilha de discursos pré-fabricados, coleta-se muita informação de todos e desenham-se milhares de algoritmos destinados a encontrar brechas para influenciar nosso comportamento, nesta sociedade da especialização educa-se o homem em habilidades nunca em senso crítico, são dias em que a exploração do homem pelo homem a qualquer custo é considerada mérito e não violência injustificável, perpetuando esta sociedade onde as benesses são cada vez mais mal distribuídas entre os que nasceram para ser iguais.

Tudo isso o levou a refletir sobre o que trazia do lugar do qual vinha uma sociedade onde o medo à solidão impera, onde os homens aderem a discursos funestos ao bem estar social, tão somente para serem aceitos no rebanho, fazer parte de uma engrenagem conduzida por discursos violentos e discriminatórios, aos quais resistir é preciso.
               
Pode também sentir que havia movimento naquela assembleia onde a coerência era consequência direta da vida no momento, nunca um compromisso com um passado não mais existente, as decisões são pessoais, intransferíveis e refeitas no tempo sem ligação com os próprios discursos anteriores menos ainda com pretensos discursos futuros.
               
Foi assim que pude saber desta assembleia de homens livres, um verdadeiro sonho da humanidade, enquanto recebia o abraço de despedida deste homem que nunca mais vi, meus sentidos curtiam este presente ganho, uma marca forte de esperança em minha alma, o qual não poderia deixar de repassar e é o que faço a narrar-lhes este encontro.    

domingo, 23 de setembro de 2018

O Justo - Releitura dos Miseráveis - miniconto.


                Quando você me perguntou o que eu estava lendo ontem no ônibus no momento em que me viste pela janela ao passar naquela parada onde esperavas o teu ônibus, confesso não tive nenhuma dificuldade de lembrar, bem o sabes que tenho o costume de ler dois ou três livros ao mesmo tempo, mas estamos em um momento confuso na sociedade, vivenciando um vendaval de inconsequências, não consegui omitir-me corri em busca da reflexão sobre o homem Justo.
                Tens toda razão cara, como é bom compartilhar contigo estes deslocamentos pela cidade usando um transporte comunitário, além de cruzarmos com tantas pessoas que nos fazem bem só por serem pessoas, temos tempo para nossas leituras, para nossas conversas, para admirarmos o ser humano no seu dia a dia, sem falar no adequado uso de energia que isso representa e na cada vez mais necessária luta contra a poluição.
                Conheço e admiro suas ideias sobre usar transporte coletivo, a opção de andar á pé, por sinal meu meio de transporte favorito caminhar, em veículos não poluentes como a bicicleta, são os que sempre nos geram oportunidades de conviver com o pouco de natureza que as cidades ainda nos reservam, mas voltando ao nosso tema busquei na minha prateleira “Os Miseráveis” do grande Victor Hugo para reler e era este o livro daquele dia por que penso que é um dos que melhor traduz o conceito de ser Justo.
                Sim tenho discutido com vários de nossos amigos, aceleramos a vida e perdemos a capacidade de autocrítica nos transformando cada vez mais em personagens de ideias em lugar de assumirmos nosso papel real de seres humanos, pouco a pouco perdemos a capacidade de sermos protagonistas no roteiro de nossa própria existência.
                Está lembrado meu amigo de anteontem, aquela discussão absurda no café, conhecidos nossos aos quais prezamos pessoas que nada devem a inteligência e ao bom senso, enfrentaram-se em um discurso a beira do ódio, defendendo uma cartilha ideológica sem o filtro de uma análise de consciência amparada nos seus valores pessoais, acabou se transformando em um discurso vazio sem nada a trazer de positivo para ninguém.
                Sim é isto mesmo, todos nós temos uma ideologia sem exceção, em diferentes graduações  partindo de um lado da defesa a inclusão até na outra extremidade a excludente discriminação, mas acima de tudo temos valores pessoais que desenvolvemos em nós mesmos e sempre são estes que devem guiar-nos, nunca um conjunto de regras escritas por terceiros estas apenas a estes servem, ao nos adequarmos á forma estaremos abrindo mão do nosso livre arbítrio.
                Lembras-se daquela roda de cerveja onde a conversa transitou pela questão do mérito em mundo de oportunidades iguais, o que mais nos impressionou foi à dificuldade de aceitarem os privilégios que os diferencia e torna injusta a competição a não ser que se considere mérito diferenças provenientes do acaso, acabamos por concluir que simplesmente não queremos perder nosso status quo e o defendemos contra os outros em lugar de buscarmos uma distribuição mais justa do produto social.
                E quando nos deparamos com aquele grupo de autoconsiderados eleitos que teimosamente insistiram que a não adesão às regras por eles criadas significava nosso rebaixamento a um grupo inferior de seres humanos, como se tivessem o direito de definir quem é o que, pudemos lhes mostrar que em períodos diferentes da humanidade e até em mesmos períodos em organizações sociais diferentes os ungidos são outros e muitas vezes completamente divergentes entre si, entretanto continuaram a preferir encastelar-se em sua autoestima baseada na diminuição do outro.
                Lembro-me daquela noite no entorno da fogueira tal qual um jogral um relatou:
- “Sentados na areia em pleno parque a peça teatral rolando e éramos nós um só publico nos divertindo com a comédia bem representada, tínhamos poderes econômicos diferentes, tínhamos peles de cor diferente, tínhamos opções sexuais diferentes, mas éramos sim um só publico, feliz curtindo o prazer de uma boa peça de teatro ao ar livre, sem entrada que não fosse o custo de parar, sentar e curtir, apenas exercício de vontade pessoal a nos unir neste espetáculo de vida comum, onde era dada a cada um a oportunidade igualitária de diversão, ninguém em momento algum precisou perguntar o que se pensava da peça apenas somamos as diferentes quantidades e tipos de gargalhadas em um prazer coletivo”.
                Outro sugeriu:
- “Como achar o justo senão dentro de nós mesmos e se assim o é como julgar o outro pelo meu conceito de justiça se a mesma esta dentro dele, como bem disseram o que você fala é parte inteira do que você acredita, quando você me diz que esta rosa é bela, legal, só tenho que pensar que ela é bela para ti, independente do que ela representa para mim, a soma destas representações é a própria vida e não posso lhe roubar a beleza dela que tu tens apenas a posso somar ao conceito que ela tem para mim”.
                Eu comentei:
                - “Quando você me perguntou o que estava lendo no ônibus naquele dia foram nestas coisas todas que estava pensando nesta vida que levamos nós todos tão diferentes em talentos e oportunidades, mas que nos aproximam a cada dia mais na busca do homem justo que cada um de nós merece ser, onde nossos argumentos por mais contraditórios que sejam não são uma cadeia de ódio e sim o respeito por uma vida sempre diferente da nossa desde que tenhamos a abertura de ouvir o outro como um ser único como conceituamos a nós mesmos”.
                Você disse:
                - “Não encontra eco neste tipo de procedimento qualquer comportamento que necessite da exploração de outro para beneficio próprio, homens livres trocam entre si seus valores com respeito mutuo e generosidade nunca com ganância, pois esta ultima é que nos leva aos conflitos e ao mundo de guerras que nos acostumamos a vivenciar”.
                Nosso amigo defendeu:
                - “Caminhar lado a lado respeitando as individualidades esta sendo o aprendizado que realizamos juntos, não é fácil por certo, mas encontrar dentro de si as motivações para todos os meus atos bem o sabemos é o único caminho para a felicidade, todos os nossos movimentos não podem ser conduzidos por outrem que não seja nós mesmos, sob-risco de ao tentarmos morrermos para nós mesmos”.
                Se eu busquei na releitura de Vitor Hugo o conceito de justo, não foi porque acredito que ele tenha a verdade e sim porque acredito que no contraponto da leitura encontro a verdade dentro de mim, assim como quando me aproximo de você e de nossos amigos no comprimento da minha vocação política encontro a mim mesmo.
                Vamos em frente é já ali na esquina que encontraremos mais outros iguais a carregar sua vida com prazer e felicidade e assim juntos criarmos o mundo dos libertos, não existe tarefa desagradável quando da escolha pessoal de cada um, por outro lado tudo o que fazemos por imposição sutil ou violenta de outro sempre é penoso e insalubre.

sábado, 22 de setembro de 2018

Tentando Entender: Feridas Abertas - miniconto.


                Caminhando contigo que por certo já foi meu parceiro confidente em outras oportunidades, podes apostar não me esqueço disso, sou agradecido por cada palavra minha ouvida por ti, por cada frase minha sentida por ti, elas só aumentam a coragem para seguirmos neste caminho, ao encontro das feridas abertas que tento e imagino tentamos entender.
Um pouco de tudo isso é o que pretendo compartilhar, assim estamos começando não pelo tradicional “era uma vez”, mas por este colecionador das imagens da própria alma originadas nos encontros com o espelho que é o outro nosso irmão, deste, se assim podemos ter a liberdade de definir, espírito caminhante observador.
Vamos juntos nesta.
                Circulando por estas ruas da nossa cidade que sempre me pareceram uma oportunidade de respirar, sim aspirar e expirar o ar limpo que a abundante arborização permite, mesmo que, ainda há o insistente poluir destes nefastos automóveis com sua tecnologia decadente, confesso que muito mais ainda do que curtir o ar a oportunidade de vasculhar-me por inteiro, no contraponto do que vejo durante este meu deslocamento me dá muito prazer.
                Estais vendo meu amigo como não precisamos sair do quarteirão para me ver ali sentado na calçada, me dei conta que assim estou há repetidos muitos dias, tal qual em uma classe escolar ou em uma mesa de escritório ou ainda em um banco de praça, e veja o que não é surpresa tenho um cartaz solicitando ajuda em alimentos ou o que puderem dar.
Tento entender o que esta ferida social aberta tem a ver comigo que lhe falo, percebo que pequenos detalhes podem deixar a mim a você ou a qualquer outro nesta situação, podes crer não é que me irrite que me chateie, até consigo enfrentar a situação com certa indiferença, o que em um rápido exame de consciência me parece assustador, talvez seja uma questão de tentar manter a sanidade mental.
Ok fecho contigo participamos de um grande sorteio para sabermos que peças nós seremos no tabuleiro, porque é um jogo onde poucas peças tem ótimo valor.                  
                Mais dois ou três passos quase tropeço nas frases que me chegam de uma mesa de bar nascidas em um dialogo desencontrado entre parceiros no entorno de vários gelados copos de cerveja:
- Cara o que tenho é porque batalhei muito para ter e não faz nenhum sentido via ou não governo gastá-lo com outros (lembrei-me na hora de que ele era de família classe média na qual se não tinha excessos tinha o necessário).
- Tenho amigos gays dos quais eu gosto muito, eles são discretos ficam na deles, o que não dá para aguentar aqueles ”veados loucos” com suas sacanagens em publico (lembrei-me na hora de várias bebedeiras da qual ele participara nada discreto por sinal “enchendo o saco” de todo mundo).   
- Convivo com negros todo dia e são verdadeiras almas brancas, não são marginais apenas não nos visitamos por falta de oportunidade (lembrei-me na hora que além de serem poucos foram colocados em convivência por puro acaso).
- A mulher deve ser protegida e valorizada por sua natureza carinhosa e frágil, delicadeza de traços que a impedem de competir com sua sublime vocação de mãe (lembrei-me na hora de que a mantinha em casa “cuidada” enquanto curtia horas divertidas de bar com os amigos).
                Cara estas feridas abertas na humanidade exigem sim o enfrentamento, a responsabilidade é de todos nós, não me contive e parti para o debate expus à mesa as minhas lembranças, coloquei-lhes o que a discriminação contra a pobreza gerada por falta de oportunidades iguais, contra os diferentes gêneros por não os entender, contra a oportunidade de crescimento da mulher por medo de perder o poder e contra as diferentes raças por preconceito, provinha da chamada civilização e não de humanidade dentro da cabeça de cada um.
                Sim entendo teu ponto de vista, foi assim mesmo que aconteceu, usaram argumentos que estão por ai, jogados como verdades provadas defendendo discriminação tipo à falta de esforço, meritocracia e coisas do gênero, mas confesso que não o aceito como tempo perdido estas intervenções para restabelecer a igualdade e fraternidade porque ás vezes o que é dificil aceitar publicamente lá dentro da gente fica cutucando e ajudando na mudança.
                Também estou concordando contigo sobre a nossa vocação, inata do ser humano, de animal político, um ser que se lança ao outro, por isso mesmo não podemos aceitar qualquer gestor como legitimo quando constrói sua liderança baseado no discurso construído sobre o que as pesquisas dizem que a comunidade quer ouvir e aí te dou toda a razão é apenas oportunismo para comprar meu trabalho barato, ou ainda ter minha conivência no papel da exploração de terceiros, como você eu também não pretendo jogar este jogo.
                Você esta me falando na nossa vocação para o prazer e a felicidade o que é oportuno neste momento quando estamos adentrando neste lindo parque cujas árvores e flores nos enchem os olhos clamando por integração com a natureza, também sei que não conseguimos realiza-la por inteiro, pois ambos sabemos, mesmo contra a nossa vontade, temos privilégios construídos por nossos antepassados, uma cadeia de gerações bem alimentadas uma quantidade de riquezas passadas de pais para filhos e que sempre em sua origem primeira tem a violência da espoliação de terceiros, resistir é preciso para recuperar o prazer e a felicidade e a melhor distribuição dos bens que são de todos é o ponto alto desta resistência.
                Não tenho nenhuma dúvida disto esta guerra permanente por um ombro a pisar, regra primeira desta sociedade competitiva por um sonho fugaz, o do consumo, só poderia resultar em uma humanidade de depressivos, bem sabemos que o homem nasceu para cooperar e não para competir em um jogo de cartas marcadas que defronta a autoestima de cada um de nós, nos empurra sempre em direção á infelicidade, impõe a angustia por este continuado novo desafio vazio a ser transposto.
                Fazes sim muito bem ao negar-se a participar deste movimento de dar-se valor pela diminuição do outro, é a matemática que não deu certo, a que subtrai valor para agregar competência pessoal, gera o dialogo do ódio que estamos vivenciando, que em tudo me tira o poder de criar, invertemos o principio as ideias vem das pessoas e não o contrario onde enquadramos pessoas às ideias. 
                Certo meu amigo vamos programar muitas caminhadas como esta, com espaço ilimitado para novos companheiros, sempre buscando acertar o passo de potencializar o homem transcendente que existe em cada um de nós apesar de tantas feridas abertas na humanidade com a convicção que estas têm na cura o caminho inevitável, sigamos a caminhar rumo à fraternidade e igualdade, até...


domingo, 9 de setembro de 2018

Rejeito Ser um Discurso em verso.

Tuas palavras, discurso avaliar posso,
Tua pessoa, julgar seria indecente,
Molde feito caixão, para ninguém eu endosso,
Por aderir à causa doutro então a si mente.

Palavras ao vento circulam no tempo,
Sempre assim o foi nas nossas comunidades,
Os passivos viram a vida em passatempo,
Os ativos espalham as novas verdades.

Digo que as palavras da vida são sempre eco,
Nunca vida será a frase submetida,
Inverso o discurso me transforma em boneco,
E não tem o homem a dignidade mantida.

A inexistência do ontem só projeta o muro,
Separa a frase presente doutra qualquer,
Sabemos não se repetirá no futuro,
Dito já está morto e existir não requer. 

Investiga-nos hoje algoritmos big data,
No momento nos faz evitar o pensar,
Assim exploradora maquina, nos cata,
E como discurso desata a nos prensar.

Resistindo sempre ao momento rebanho,
A força da solidão estampa liberdade,
Evitando a discriminação do tacanho,
Tenho vida independente e maturidade.

Rejeito Ser um Discurso


     Não adianta insistir não pretendo e defendo que ninguém deveria aceitar encaixarem-se no molde de um discurso, ao discurso posso associar méritos e defeitos, posso tirar e colocar qualidades nos seus conteúdos, eu posso elogiar e denegrir o seu estilo, em suma posso julgar o discurso o que não é aceitável para o homem.

     É vocação dos homens fazerem discursos, fato notório indesmentível confirmado pela história da humanidade, os mesmos são sempre, ou repetidos por indivíduos que se negam a refletir em um momento dado, ou contestado em novos discursos que se justificam por reação aos lidos e analisados, eu penso que esta dinâmica trabalha todo um imaginário que esta há movimentar nossos dias e sempre assim o foi.

     Quero deixar claro que nada tenho contra o discurso, pelo contrario penso que é uma obrigação consigo mesmo de todo o ser humano discursar, apenas não podemos subordinar a vida ao mesmo e sim defini-lo como o eco inevitável da vida por qual optamos a cada momento como nossa e assim sendo nos abre uma nova constatação a do questionamento quanto à coerência do mesmo no tempo.

     Se o discurso é consequência direta da vida nunca podemos exigir-lhe coerência com discursos anteriores, quando admito que viva um momento de cada vez e este mesmo momento é consequência de tomada de decisão pessoal, intransferível, só admissível naquela situação específica, claramente desvinculo meu discurso atual com os anteriores e porque não dizer com os futuros também.

     Certamente já perceberam minha preocupação, sim estou estarrecido com o enorme esforço empregado em tecnologia para enquadrar o homem no caixão dos discursos, nestes tempos de big data e seus algoritmos de bisbilhotar nossos rumos, nestes tempos de especialização de tarefas que levam sempre o homem a ser educado em habilidades nunca em senso crítico nunca no pensar, nestes tempos que a exploração do homem pelo homem a qualquer custo é considerada mérito e não violência injustificável, perpetuando esta sociedade onde as benesses são cada vez mais mal distribuídas entre os que deveriam ser iguais.

     Resistência é uma palavra forte principalmente nos tempos de rebanho, rejeitar ser um discurso enquadra-se como uma das primeiras atitudes desta resistência, nós constantemente necessitamos ter a atitude de questionar as tabuas da lei, estou morrendo se decido pelas leis escritas por terceiros e estou vivendo quando decido por leis construídas dentro de mim a cada momento.

     O que me chama atenção é o enorme medo à solidão que tem levado nós homens a aderirmos a discursos, á nos verdadeiramente prejudiciais, em nome de ser aceito no rebanho como parte de engrenagem a ser conduzida por discursos violentos e discriminatórios, aos quais resistir é preciso.

sábado, 8 de setembro de 2018

O Justo - Releitura dos Miseráveis em verso.


Ser O Justo encontrado em cada ser humano,
Victor Hugo expõe no seu livro Miseráveis,
Leio e releio em busca dos outros, ser mano,
Recriando meu ser em homens amoráveis.

Se eu busco meus valores em doutros cartilha,
Não encontro no interior meu pensar liberto,
Sem alma uma ideologia compartilha,
Sendo todo meu passo então, só o não certo.

Vida sem senso de justiça planta ódio,
Discrimino no clube de poucos eleitos,
Desqualifico os outros em troca de um pódio,
Da falta de amor sempre são estes os efeitos.

Ponho a minha mão forte a serviço da Guerra,
Eu Violento discrimino e escravizo o homem,
Em nome de um argumento destruo a terra,
E deixo que de todos, dignidade tomem.

Urge encontrar o justo hoje em nossa pura alma,
É o que nos diz nosso grande Victor Hugo,
Se em suas paginas deixar olhos com calma,
Como só minha esta tarefa não refugo.

Prazer e felicidade é questão intima,
Que feito grande rio nos outros deságua,
Só por mim pode se tornar a legitima,
Que para os outros todos os males enxágua.

O Justo - Releitura dos Miseráveis.


     Talvez estas páginas de Victor Hugo do livro “Os Miseráveis” do qual estou vivendo a releitura contenham a melhor definição para conceituar O Justo, tenho por mim que estamos em um momento no qual necessitamos recuperar esta construção não de um personagem e sim de sua existência como ser humano.

     Parece que perdemos a capacidade da autocrítica que permite encontrar em nós mesmos a discussão de conceitos comportamentais adequados para a humanidade, hoje preferimos usar uma guia de um discurso ideológico como apoio aos nossos procedimentos do viver o dia a dia quando deveríamos optar por uma análise de consciência amparada em nossos valores.

     A posição de conforto que significa tomar decisões com base em uma cartilha que, apesar de por mim escolhida, é escrita por terceiros não me parece adequada ao livre arbítrio tão caro á nós homens, sempre que enxergo tudo apoiado nestes óculos que em verdade não são meus estou abrindo mão do optar e me deixando conduzir por outrem.

     Não raro perco completamente o senso de justiça vivendo e semeando mais o ódio que o amor, sim porque ódio é a desqualificação inadequada do outro com fins de descriminação, um pouco aquela utopia inventada de estar entre os poucos eleitos que acaba por me justificar perante mim mesmo, por óbvio que para ser um dos poucos tenho que julgar o outro como um desqualificado frente a mim e aos meus.

     Com base na desmoralização do Justo passamos a construir a ferocidade das guerras, a insensatez da escravidão do homem pelo homem, a ignorância violenta da discriminação, a injustiça da má distribuição dos bens produzidos por todos, sempre amparados em argumentos, pois o papel tudo aceita, que são apenas construções arbitrárias de lógica independente de valores associados ao ser humano.

     Prestamos-nos ainda para o descalabro do pueril bate boca entre partidários de diferentes bíblias de pensamento, cada qual afrontando o outro por ridicularizar as ideias e as pessoas que as abraçam via diminuição e nunca por adição de valores em um processo que se radicaliza em cada vez mais baixo nível de agressão.

     Reencontrar O Justo dentro de cada um de nós é uma tarefa que requer urgência para que possamos conviver comunitariamente entre humanos em harmonia com a natureza, é o chamamento que encontro em cada página relida deste clássico da literatura universal escrito por Victor Hugo, sendo este reencontro uma tarefa pessoal e intransferível, algo que só eu posso fazer por mim mesmo, porém esparramar-se-á sobre todo o universo.            

     Temos muitas questões de fórum intimo que em primeiro lugar são importantes para o nosso prazer e felicidade pessoais e como consequência imediata irradiam este clima para todos os nossos iguais, para estas não podemos abrir mão da reflexão individual e em nenhuma hipótese transferirmos esta responsabilidade para terceiros pode ser feito, a pena para tal e a infelicidade nossa e dos outros.  

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Tentando Entender: Feridas Abertas em verso.


Só o outro igual me realiza como todo,
Riqueza, gênero ou raça sendo diversa,
Se não aceito me enterro inteiro neste lodo,
De ser a ferida aberta não tem conversa.

No outro o irmão vejo meu melhor como político,
Sem frases por encomenda para seu ouvido,
Boa vida juntos fala o senso critico,
De caminhar é meta ao qual sou movido.

Bens mal distribuídos pela violência,
Nascemos em desiguais oportunidades,
Direitos iguais nos diz a boa ciência,
Buscar o justo, missão das comunidades.

Competir mata em nós o cooperativo,
Da genética nossa vocação a primeira,
Criando este conjunto humano depressivo,
Mutilado da compra de poder na feira.    

Se meu Crescer é subtrair talentos de outrem,
A matemática da vida me reprova,
Destino seja ódio do embarcado trem,
Então continuo o mesmo sem vida nova.

Tentando entender estas feridas abertas,
A humanidade sem os homens encontrar,
Nunca o ser humano com as medidas certas,
Em transcender o mundo temos que virar.

terça-feira, 4 de setembro de 2018

Tentando Entender: Feridas Abertas.


      Tentando entender: Como posso ter completude como ser humano, se não consigo ver o outro como similar a mim, independente das nossas distintas condições econômico/sociais, dos diversos gêneros aos quais somos pertencentes, dos inúmeros tons que as raças estampam em nossos corpos, somos todos construídos do mesmo barro. São feridas em aberto na humanidade como um todo, qualquer discriminação, mesmo que seja um só homem a executá-la exige um enfrentamento cuja realização deve ser responsabilidade de todos.

     Tentando entender: Como posso afirmar-me como ser político, se não consigo priorizar o melhor para o outro e sim vantagens pessoais em nome da necessidade de um jogo ganha/ganha pelo poder, em vez de pregar boas praticas para uma humanidade mais comunitária com uma melhor qualidade de vida, trabalho um modelo estratégico de marketing  baseado em frases panfletárias construídas apenas para agradar uma maioria, sempre á partir de fartas pesquisas de como funciona o comportamento e as necessidades humanas, que por isso mesmo, nunca serão executadas quando nos forem delegadas as responsabilidades da gestão da comunidade.

     Tentando entender: Como posso abraçar a alegre vocação do homem por prazer e felicidade, se não consigo perceber que a desigualdade de oportunidades é o alicerce deste modelo de sociedade mantenedora de privilégios, do qual sou participe caso não tenha consciência e engajamento de resistência, modelo este que construímos e a mantemos de geração em geração, utilizando-nos das diversas faces com as quais a violência contra o homem pode exprimir-se, sempre alicerçado na injusta distribuição dos bens produzidos, das riquezas que de fato são de direito igualitário de toda humanidade.

     Tentando entender: Como posso aceitar-me como saudável espiritual e fisicamente, se sou cúmplice em fecundar a criação de seres humanos depressivos por uma exigência absurda de competição entre nós que nascemos com a vocação para o trabalho cooperativo, este ambiente de batalha permanente expõe-nos a altas doses de adrenalina, acima do que é possível suportar pela maioria de nós, gerando como em todas as guerras uma legião de mutilados e pior no encalço de ilusórias fantasias de sucesso, pois a cada degrau percorrido apenas encontramos infelicidade e angustia pelo desafio de um novo a ser transposto.

     Tentando entender: Como posso denominar-me como criador, se trabalho todo o dia na diminuição do outro como modelo de distinguir-me, tratando com mais importância o subtrair talentos de terceiros do que a agregação de minhas competências e assim incentivando este dialogo do ódio que cresce dia a dia na convivência entre nós seres humanos, onde as ideias são muito mais importantes que as pessoas esquecendo-nos que elas, as ideias, só existem por causa das pessoas.

     Tentando entender: Como podemos potencializar homem que somos a transcendência com tantas feridas abertas.